O presidente da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), Jorge Picciani (PMDB), foi entrevistado pelo programa CBN Rio na manhã desta segunda-feira (16/01). O deputado falou sobre o acordo firmado entre o Governo Federal e o estado do Rio que prevê a suspensão do pagamento da dívida com a União por até quatro anos, e a adoção de medidas como contrapartida, como a elevação da contribuição previdenciária dos servidores e a criação de uma alíquota extraordinária temporária na folha de pagamento.
Picciani falou sobre as diferenças entre as medidas que devem ser apresentadas pelo Governo para votação na Alerj a partir de fevereiro em relação ao pacote enviado no mês de novembro. Para ele, o quadro atual é mais favorável por haver uma saída clara sinalizada pela União. “Neste ano, há um plano de recuperação fiscal que é estruturante”, destaca. “A diferença é que, quando analisamos aquelas mensagens no fim de 2016, não se tinha garantia da possibilidade de quitar os pagamentos dos salários. O que temos agora é uma possibilidade real”, completa.
CBN: Em 2016, essas medidas foram enviadas à Alerj e houve uma mobilização contrária muito grande por parte de servidores estaduais e até de deputados. O senhor, na época, devolveu algumas das medidas, adiou a votação de outras para 2017 e também fez críticas ao Executivo. O que mudou? É possível aprovar esse pacote e qual será o seu papel nesse processo?
Jorge Picciani: Em primeiro lugar, há diferenças marcantes entre o chamado "pacote de maldades" e esse que, eu diria, é o "pacote de realidades". A presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministra Carmem Lúcia, foi fundamental quando impediu o bloqueio das contas do Rio de Janeiro e reabriu as negociações entre o Governo Federal e o Estadual. As representações da União e do Governo do Rio chegaram a um entendimento que eu acredito ser o único que possa tirar o Estado do buraco em que ele se encontra e do sofrimento que passam os servidores e os habitantes que estão com os serviços precários na área da saúde e que começam a se agravar na segurança. Neste ano, há um plano de recuperação fiscal que é estruturante. Não adianta tapar o buraco e ele abrir mais tarde por conta de uma chuvinha. Esse pacote permite a recuperação do estado para que ele se torne novamente um estado forte e que paga os servidores em dia.
Hoje, o servidor do estado ainda está recebendo parcelas do salário de novembro e com o pagamento de dezembro e do 13º salário atrasados. No entanto, as famílias não estão conseguindo cobrir suas despesas. Hoje, certamente isso tem tido um custo para a família dos servidores que é muito grande. O governo federal está oferecendo, com o aval da presidente do Supremo, que o Rio de Janeiro possa pagar, até o final de fevereiro, o salário de dezembro, o 13º e botar os salários dos servidores em dia. Qual é a contrapartida, que é temporária? É que os aposentados e pensionistas, que hoje não contribuem com a Previdência, irão contribuir, já que o Rio estourou sua folha de pagamento. Só no período Pezão, com todas as dificuldades, os salários aumentaram 20% e isso não teve na iniciativa privada.
CBN: Em 2014, enquanto fazia campanha, o governador Pezão mandou um pacote para a Alerj cheio de bondades, que deu aumento reais para várias categorias e que, hoje, ele não está conseguindo pagar.
JP: Na média, de 2014 para cá, é 20% real. Mas, se pegarmos os cinco anos, são 70% reais. Deu-se um aumento acima das posses do estado, até porque temos uma crise econômica nacional, com 12 milhões de desempregados na iniciativa privada. Muitos tiveram carga horária e salários reduzidos, mas isso não vai acontecer com os servidores do nosso estado. No entanto, os aposentados terão uma contribuição provisória de 6% em um período entre 2 e 3 anos. Se recuperarmos a economia do Rio, pode ser que consigamos, em 1 ano, dar um reajuste da inflação, que está caindo.
CNB: Se houver esse pagamento de 6% e o aumento da taxação da previdência, na prática, é como uma redução de salário porque o servidor irá embolsar menos.
JP: Se não houver esse acordo com a União, daqui a pouco teremos seis meses de salário atrasado e ficaremos como o Rio Grande do Sul, que está quitando salários em 10 parcelas. Quando você paga em 5 parcelas com meses de atraso, como está ocorrendo no Rio de Janeiro, as pessoas ficam pagando juros sobre as contas de luz e telefone e do aluguel. Quando o servidor receber os pagamentos restantes e souber que irá receber no próximo mês, ele reprograma sua vida e seu custo diminui. O que ele vai contribuir provisoriamente para a previdência é o que ele vai deixar de pagar de juros. Eu vou defender [as medidas] porque é uma questão de Estado. Nós temos que voltar a prestar serviços de qualidade à população.
CBN: Caberá aos 70 deputados estaduais a aprovação das medidas do pacote e, em novembro e dezembro do ano passado, eles ficaram assustados com a reação popular às medidas. Os deputados terão que disputar uma eleição em pouco mais de um ano e são medidas impopulares. Dá para aprovar um projeto tão duro assim?
JP: Estamos em uma situação muito difícil e estamos tendo uma oportunidade sem igual, sendo o primeiro estado a receber uma possibilidade de recuperação fiscal. A diferença é que, quando analisamos aquelas mensagens, não se tinha garantia da possibilidade de quitar os pagamentos dos salários. Vários presidentes de sindicatos perguntaram nas reuniões de líderes e ninguém soube responder se havia essa garantia. O que temos agora é uma possibilidade real. Eu só tenho um voto e vou trabalhar para conseguir os outros e o Governo também. Até porque nós pretendemos votar as medidas que forem referendadas pelo Supremo e não o pacote, exatamente no momento em que o governo federal já tiver liberado os recursos. Caso as medidas não sejam aprovadas, em 90 dias, a União vai cobrar a conta. Se não fosse a ministra Carmem Lúcia, teríamos R$ 800 milhões bloqueados e estaríamos devendo um percentual muito maior da folha de novembro e isso iria se agravando. Então, não é questão de popularidade. As pessoas têm que pensar "como se salva o Rio de Janeiro?" e "como se aproveita o apoio do Supremo, do presidente da República e do Supremo?". Essa é a conta que eu quero discutir com meus colegas na Alerj.
CBN: Alguns projetos enviados no ano passado nem foram à Plenário, sendo adiados para 2017 ou devolvidos ao Executivo. E agora? Esses projetos serão aceitos se o Governo enviá-los? Muda o seu próprio estado de espírito em relação às propostas?
JP: Hoje, não se fala em tributar os aposentados de 0% para 30%, mas sim, provisoriamente, em 6%. A proposta que define o aumento da contribuição para 14% será colocada em votação na Alerj. E nós vamos votar as outras que vierem e me parece que, para o pessoal da ativa, a contribuição provisória será de 8%, mas tudo muito abaixo dos 30% que se pretendia. Só que agora nós temos uma contrapartida. O Rio de Janeiro vai ficar três anos sem pagar o serviço da dívida, a dívida vai ser alongada por 20 anos, o estado irá receber crédito de royalties, vai ter reajustado a tabela de royalties, que foi uma ação dos deputados Luiz Paulo (PSDB) e Edson Albertassi (PMDB) na CPI da Petrobrás, que investigava perdas do Rio de Janeiro, e que faz com que a MP pense em votar uma nova pauta, que deve gerar R$2 bilhões de royalties em petróleo e gás. É uma série de direitos que o Rio vinha perdendo e que será consagrada nesse acordo. As decisões da União e do Supremo estão permitindo que o Rio recupere várias receitas e várias linhas de crédito, além de alongar a dívida e ter três anos de carência, o que representará, esse ano, R$ 13 bilhões para o estado.
CBN: Qual é o ânimo dos deputados e da oposição na Alerj quanto à votação dessas medidas?
JP: Há muita desconfiança. Estou conversando com os deputados e, evidentemente, as pessoas estão vendo que há uma diferença. Poderíamos reclamar que uma série de coisa poderiam ter sido feitas há anos atrás, mas isso já passou. Agora precisamos enfrentar essa crise.
CBN: O governo irá admitir que não cumpriu a Lei de Responsabilidade Fiscal e é bem provável que os repasses obrigatórios para saúde e educação não tenham sido cumpridos. Essas medidas dariam margem para o governador, certo?
JP: Nós não estamos nessa situação porque o Rio votou a calamidade financeira do estado e isso está previsto na Lei de Responsabilidade. Com a Alerj reconhecendo a calamidade, aumentam-se os prazos para cumprimento do previsto na Lei e livra o Governo, mas com um prazo até o final de 2017.
CBN: Alguns ouvintes pontuaram também uma necessidade de cortes na Alerj, como forma de dar exemplo.
JP: A Alerj cortou despesas desde o dia 2 de fevereiro de 2015, quando reassumi a Presidência, nós cortamos em 25%, em média, os contratos. Isso deu um superávit que nos possibilitou comprar para os presídios e para o Degase os scanners corporais. Nós também doamos R$ 70 milhões para a Segurança e, mais recentemente, decidimos não renovar a frota e, ao terminar o mandato atual, doar os carros à Segurança. Também acabamos com os selos, com os carros de diretores e com as sessões extraordinárias, que aconteciam durante à noite. Essa última medida representará R$ 18 milhões de economia esse ano, fora a diminuição do gasto com energia e ar condicionado.
CBN: O senhor mesmo criticou o Executivo por demorar a tomar medidas contra a crise. No entanto, não fica uma sensação de injustiça com o servidor, que continua a trabalhar e agora será punido por erros cometidos pelo Governo?
JP: Não há dúvida. O ideal seriam medidas mais duras de gestão, como corte de contratos. Eu mesmo propus que se auditassem os 100 maiores contratos. O Governo também cortou, inclusive, 30% dos cargos comissionados e cortará mais 20%, mas não é suficiente. É preciso juntar todas as contas, melhorar a gestão e recuperar a arrecadação porque estamos em uma crise nacional. Até as Olimpíadas, o índice do desemprego no Rio era menor que a taxa nacional, hoje é maior. Não é uma situação fácil e por isso requer sacrifícios para que as pessoas possam colocar suas vidas em dia, principalmente os servidores.